Procedimentos Oficiais para a Verificação da Esterilidade
A USP <71> define dois procedimentos oficiais que devem ser utilizados para testar a esterilidade de produtos farmacêuticos estéreis: filtração por membrana e inoculação direta. A escolha do método depende das características do produto a ser analisado, conforme estabelecido pela United States Pharmacopeia e harmonizado com a ISO 11737-2:2019.
1. Filtração por membrana
Este é o procedimento preferencial para produtos líquidos, especialmente aqueles solúveis em água ou álcool. Ele oferece maior sensibilidade e menor interferência do produto sobre os microrganismos.
Como funciona:
- A amostra é filtrada por uma membrana estéril com poros de 0,22 µm (prática laboratorial moderna mais segura, embora a USP 71 permita até 0,45 µm).
- Essa membrana retém eventuais microrganismos presentes na amostra.
- A membrana é então transferida para dois frascos estéreis:
- Um contendo meio de tioglicolato fluido (FTM) para bactérias anaeróbias (incubado a 30–35 °C).
- Outro com Caldo de Soja Tríptica (TSB) para fungos e bactérias aeróbias (incubado a 20–25 °C conforme especificação da USP 71).
- A incubação dura 14 dias, e qualquer crescimento microbiano é avaliado visualmente.
Indicações:
- Produtos aquosos, oleosos, alcoólicos ou emulsões que não interferem com o meio ou o crescimento microbiano.
- Soluções de grandes volumes.
2. Inoculação direta
Esse método é utilizado quando o produto não pode ser filtrado, como no caso de suspensões, cremes ou produtos viscosos.
Como funciona:
- Um volume definido da amostra é diretamente inoculado em frascos contendo os meios de cultura (FTM e TSB).
- Os frascos são incubados nas mesmas condições de temperatura e tempo que o método de filtração.
- O crescimento microbiano é monitorado por turbidez, mudança de cor ou depósito no fundo do frasco.
Indicações:
- Produtos insolúveis ou muito viscosos.
- Amostras que não passam por filtros sem obstrução.
- Produtos com componentes que inibem o crescimento microbiano (requerem validação específica).
Outras Etapas do Procedimento
Além da escolha do método, os procedimentos oficiais envolvem outras etapas obrigatórias para garantir resultados válidos e confiáveis:
a) Validação do método de esterilidade
Antes de aplicar o teste em amostras comerciais, o laboratório deve validar o método para comprovar que ele é capaz de detectar microrganismos mesmo na presença do produto. São utilizadas cepas padrão como:
- Staphylococcus aureus (ATCC 6538)
- Pseudomonas aeruginosa (ATCC 9027)
- Bacillus subtilis (ATCC 6633)
- Candida albicans (ATCC 10231)
- Aspergillus brasiliensis (ATCC 16404)
- Clostridium sporogenes (ATCC 11437)
Critérios de validação específicos:
- Recuperação mínima de 70% dos microrganismos-teste
- Crescimento deve ocorrer em até 3 dias para bactérias
- Fungos podem levar até 5 dias para apresentar crescimento visível
b) Controle ambiental rigoroso
Os testes devem ser realizados em ambiente ISO Classe 5 (Grau A), com condições específicas:
- Pressão diferencial mínima de 12,5 Pa
- Monitoramento contínuo de partículas
- Troca de ar mínima de 20 renovações/hora
- Pessoal treinado seguindo técnicas assépticas rigorosas
c) Controles positivos e negativos
É necessário utilizar controles positivos (com microrganismos viáveis) e controles negativos (sem microrganismos) para garantir a confiabilidade e sensibilidade do teste.
Incubação e Observação
Durante os 14 dias de incubação, os frascos devem ser inspecionados regularmente. A interpretação dos resultados segue critérios específicos estabelecidos pelas práticas de QA/QC farmacêuticas:
- Ausência de crescimento: produto considerado estéril
- Crescimento em 1-2 unidades: investigação obrigatória para identificar possível erro técnico
- Crescimento em ≥3 unidades: reprovação automática do lote
Caso seja detectado crescimento microbiano, o lote é reprovado, a menos que uma investigação comprove erro técnico justificado.
Conclusão
Os procedimentos oficiais da USP <71> são rigorosamente padronizados para garantir que os produtos estéreis estejam realmente livres de microrganismos viáveis. Seguir corretamente cada etapa — desde a escolha do método até o controle ambiental e a validação — é essencial para proteger a saúde dos pacientes e garantir a conformidade com os padrões regulatórios internacionais.
Referências Técnicas:
- USP <71> Sterility Tests - United States Pharmacopeia (https://www.usp.org/harmonization-standards/pdg)
- ISO 11737-2:2019 - "Sterilization of health care products — Microbiological methods"
- FDA Guidance for Industry: Sterile Drug Products (2004) - (https://www.fda.gov/media/70937/download)